SÉRIE ESPECIAL – O SILÊNCIO DAS VÍTIMAS: A LUTA INVISÍVEL CONTRA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO MUNICÍPIO DE HUMAITÁ

Humaitá (AM) – O som vibrante da cidade se mistura ao silêncio ensurdecedor de muitas mulheres que vivem sob a sombra da violência doméstica. No interior do Amazonas, onde os recursos para denúncia e acolhimento são escassos, o medo e a dependência financeira se tornam obstáculos para romper o enorme ciclo da violência.

Joana*, 32 anos, viveu essa realidade. Casada há oito anos, sofreu agressões físicas e psicológicas constantes. “Ele me dizia que, se eu fosse embora, ninguém me ajudaria. Que eu não conseguiria sustentar meus filhos”, relata. Assim como ela, inúmeras mulheres em Humaitá enfrentam uma situação parecida.

Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas, o número de denúncias na região ainda é baixo em relação à realidade dos casos. “A subnotificação é um problema. Muitas mulheres não denunciam por medo, vergonha ou por acreditarem que nada será feito”, afirma uma assistente social que atua no município e prefere não se identificar.

FATORES QUE LEVAM AO SILÊNCIO

O isolamento geográfico, comum nas comunidades ribeirinhas e indígenas, dificulta ainda mais a busca por ajuda. Nos distritos de Auxiliadora e Realidade, assim como nas vilas da Cristolândia e Ipixuna, muitas mulheres sequer têm acesso à internet ou telefone para denunciar abusos.

Além disso, o medo das represálias e a dependência econômica dos agressores pesam na decisão de não denunciar. Segundo a psicóloga, que prefere não se identificar e que atende vítimas de violência doméstica, “muitas mulheres sentem que não têm para onde ir, especialmente quando há filhos envolvidos”.

Foto: Polícia Civil em ação no Distrito de Realidade, em Humaitá/AM.
Divulgação PC/AM

A FALTA DE SUPORTE INSTITUCIONAL

Embora Humaitá conte com uma Delegacia Especializada de Polícia (DEP), ainda há inúmeros desafios a serem superados, como a falta de apoio às mulheres que vivem em locais mais isolados, como os distritos de Auxiliadora, Realidade e as vilas de Cristolândia e Ipixuna, o que obriga muitas vítimas a não registrar ocorrência já que não se oferece estrutura adequada para atendê-las.

A Defensoria Pública do Estado do Amazonas e o Ministério Público do Estado do Amazonas, tentam suprir essa lacuna, por exemplo, por meio da solicitação de medidas protetivas, mas a burocracia e a falta de acompanhamento jurídico e psicológico adequado dificultam a aplicação dessas medidas, ainda mais se tratando de mulheres em situação de violência que residem em comunidades afastadas, como nos casos da região do Lago Uruapiara e aldeias indígenas da região.

POLÍTICAS PÚBLICAS E MEDIDAS A SEREM TOMADAS

A criação de uma Casa de Apoio para mulheres em situação de violência e a ampliação dos serviços de assistência social são medidas urgentes para reduzir a impunidade. Desta maneira, o poder executivo, juntamente com o poder legislativo, tem papel importante na condução e execução de tais medidas. Além disso, campanhas de conscientização precisam atingir as comunidades mais afastadas, garantindo que todas as mulheres saibam que têm direitos e podem buscar proteção.

Para quem precisa de ajuda, o Disque 180 é um canal gratuito e sigiloso que pode ser acessado de qualquer telefone. Em Humaitá, denúncias também podem ser feitas diretamente na Polícia Civil e no Ministério Público.

Enquanto o silêncio persistir, a violência seguirá invisível. A luta pelo fim da violência contra a mulher precisa ser um compromisso de toda a sociedade humaitaense.

Foto: Delegada Dr.ª Wagna Costa em trabalho de conscientização acerca do tema.
Divulgação PC/AM

(*) Nome fictício gerado para proteger a identidade da vítima.

Primeiro artigo da série Vozes Silenciadas: A violência contra a Mulher e os Desafios Sociais no Município de Humaitá, que tem como objetivo a conscientização da população acerca do tema da violência contra as mulheres. Desenvolvido pelo acadêmico Leôncio Flávio Nery Júnior, editor do jornal A Tribuna de Humaitá, discente da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) em Humaitá e estagiário da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE/AM) em Humaitá. Os artigos visam promover uma reflexão e debates sobre a importância de reconhecer, denunciar e combater esse tipo de violência no município.

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